Sem sucesso, empresas tentam impedir na Justiça início da greve
Movimento paredista está previsto para iniciar após as 72 horas da notificação à TCCC e Cidade Verde, ocorrida na sexta (11). Desembargadora destaca que direito de greve deve ser assegurado
Como de hábito nos movimentos paredistas, as empresas TCCC (transporte urbano) e Cidade Verde (metropolitano) tentaram impedir na Justiça, sem êxito, o início da greve da categoria. O mandado de intimação de decisão da Justiça do Trabalho foi recebido pelo presidente do Sindicato dos Motoristas Rodoviários de Maringá (Sinttromar), Ronaldo José da Silva, neste fim de semana.
No processo, o jurídico das empresas requereu, liminarmente, que a Justiça do Trabalho obrigasse o Sinttromar a assegurar a manutenção do percentual mínimo de 90% da frota em circulação, que está reduzida por conta da pandemia do novo coronavírus. Segundo consta dos autos, a TCCC mantém em operação entre 62% e 65% da frota e a Cidade Verde, 74%.
O discurso da pandemia, alegado pelas empresas para cortar benefícios dos funcionários e para não conceder o reajuste salarial, foi utilizado na ação para tentar barrar a greve. As concessionárias do transporte coletivo pediram à Justiça que os dirigentes sindicais não realizassem atos e manifestações para evitar aglomerações, sugerindo multa de R$ 200 mil por dia em caso de descumprimento da liminar.
Em suas alegações, as empresas também tentaram induzir a Justiça do Trabalho ao erro, faltando com a verdade no argumento de que a greve estaria programada para ter início nesta segunda (14). Na verdade, o Sinttromar oficiou as empresas na tarde de sexta-feira, comunicando o início da greve após decorrido o prazo de 72 horas da notificação, e a Justiça estava ciente disso.
Em sua decisão a desembargadora Ilse Marcelina Bernardi Lora frustrou as empresas, que tentaram emplacar a “abusividade da greve” antes mesmo do início da paralisação. Levando em consideração a excepcionalidade do risco de infecções na pandemia, a magistrada determinou a manutenção de 70% do contingente de motoristas e cobradores, fixando multa diária de R$ 50 mil em caso de descumprimento.
No despacho, a desembargadora destacou o direito de greve, que é garantido aos trabalhadores pela Constituição Federal (CF). “Não há como determinar, em juízo de cognição sumária, a manutenção do percentual mínimo de 90% da frota em atividade, sob pena de esvaziar-se o exercício do direito de greve, ainda que em atividade essencial e em período de pandemia”, escreveu.
Ao apelar para a “necessária harmonização dos interesses das partes”, que poderá ser alcançada por meio da negociação coletiva, Ilse Marcelina negou o pedido de abstenção de atos e manifestações, feito pelas empresas por conta de possíveis aglomerações. Segundo a magistrada, “é indispensável equilibrar os direitos em questão, resguardando-se a saúde dos trabalhadores não grevistas e dos usuários do transporte público, bem como assegurando-se o direito ao exercício de greve, incluindo-se o direito à visibilidade das reivindicações”.
Ao permitir as manifestações inerentes ao movimento paredista, a magistrada determinou que o Sinttromar adote medidas de prevenção ao coronavírus, como o distanciamento entre os participantes, a disponibilização de álcool em gel e o uso de máscaras faciais – medidas essas que serão adotadas pelo sindicato. A multa é de R$ 10 mil por dia, em caso de descumprimento.
Reunião
Na manhã desta segunda (14), o presidente Ronaldo e o vice-presidente, Emerson Viana Silva, informaram os demais dirigentes sindicais sobre a tentativa frustrada da TCCC e da Cidade Verde de, em afronta à CF, barrar o movimento paredista. “Em todo início de greve a empresa faz isso [recorrer à Justiça] para tentar intimidar a categoria”, comentou Ronaldo.
Para Viana, as empresas não entraram com dissídio para fazer a negociação, buscando um acordo bom para ambas as partes. “Elas queriam, sim, tentar melar a greve na Justiça, mas não conseguiram”, disse o vice-presidente.
A greve terá início após as 72 horas, conforme notificação feita às empresas. O momento exato do início da paralisação já está definido, mas, segundo Viana, não será antecipado pelo Sinttromar para evitar ainda mais retaliações por parte das empresas.
Negociação
Nas últimas semanas, o Sinttromar esgotou as tentativas de um acordo amigável com TCCC e Cidade Verde, o que incluiu audiências na Justiça e até mesmo reuniões com o prefeito Ulisses Maia (PSD). Nas tratativas, as empresas se mantiveram irredutíveis no intuito de tirar do bolso dos trabalhadores uma compensação para as perdas na crise.
De acordo com o sindicato, a empresa propôs a renovação do acordo coletivo de trabalho (ACT) sem reajuste salarial, sem a participação nos lucros e resultados (PLR) e sem garantias de manutenção dos empregos. Cortes no discreto vale-alimentação – em tempos de pacote de arroz a quase R$ 40 – também são cogitados pelas empresas.
Vale lembrar que a decisão pela greve, tomada em assembleia na quarta-feira (9), ocorre após vários sacrifícios da parte dos trabalhadores, como a redução de salários e de jornada, a adoção de banco de horas e a antecipação de férias. Além dessas perdas, previstas nas medidas provisórias 936 (convertida em lei) e 937 editadas pelo governo federal, também houve redução do vale-alimentação dos funcionários do transporte público.